Lembrando do passado

         Após algum tempo obtive permissão para visitar alguns amigos no hospital fraternidade, é pra lá que muitos dos espíritos resgatados são encaminhados. Logo na entrada encontro com Dr. Alberto, depois dos comprimentos e um longo abraço ele pergunta:

         -O que veio fazer aqui por esses lados? Passeio ou trabalho?
         -Desde quando tenho direito a passeios, vim a estudo, é claro....
         -Então vamos logo, pois não tenho o dia todo, será minha auxiliar por algumas horas, temos muitas visitas para fazer....
         -Se sabia o que eu ia fazer por que perguntou?
         Rimos gostosamente, Alberto costuma ser muito ocupado e as vezes passa a impressão de ser meio brabo, pois vive sempre correndo um lado para outro, mas eu que já o conheço a mais tempo sei que é uma pessoa muito amorosa e compreensiva, e tem um humor invejável.
         Fomos na direção dos quartos, iríamos visitar Maria Regina, eu lembro muito bem dela pois ajudei em seu resgate, estava presa em uma masmorra por 200 anos, só foi resgatada por que se arrependeu e também pelo fato que uma das crianças a qual um dia ela ajudou a salvar a vida, veio pedir em seu socorro.
         Numa de nossas conversas Maria disse-me que tinha sido uma feiticeira, muito''boa'' segundo ela, no começo do ofício ajudou muita gente com chás, unguentos, rezas e até curas; recebendo em troca alimentos ou no máximo um obrigada. Mas um dia ao curar o filho de uma família com posses recebeu uma moeda de ouro, e aquilo foi sua perdição, pois nunca mais atendeu ninguém por amor, somente por dinheiro.
        -Bom dia Maria, tudo bem? Lembra de nossa irmã Fatima?
        -Bom dia Dr., como vai querida amiga Fatima?
        -Vou bem e você Maria?
        -Já estive pior, mas hoje estou bem, graças ao Dr. e a todos aqui do hospital.
        -Nada disso, graças a Deus e a você mesma, que tem se esforçado muito para mudar e aprender a ser melhor.
        -É verdade, mas nem sempre consigo, tem dias que não é fácil recordar dos erros....
        -Se fosse fácil Maria eu não teria emprego...
        Neste momento Maria meio que se perde em lembranças, recordando algo de seu passado. Essa era a deixa que estávamos esperando, nós médiuns com certas habilidades do lado de cá temos muita serventia, pois após muito treino,podemos nos conectar mentalmente com esses irmãos que muitas vezes não conseguem visualizar nitidamente seu passado, seja por medo de lembrar do que fizeram ou de não conseguirem descrever as cenas ou situações. Daí nos chamam, era isso que eu iria fazer com Maria, ajudaria com meu ectoplasma e a envolveria em fluidos de energia tranquilizante para que ela conseguisse lembrar de tudo e permanecer calma.
        Estávamos em uma caverna iluminada apenas por tochas, a claridade era muito ténue, visualizei Maria fazendo orações ao lado de um casal e um menino deitado no chão, não sei dizer se ele estava dormindo ou dopado; Maria pega um punhal e corta os pulsos fazendo sangrar dentro de um pote de barro, ao enche-los entrega ao casal que bebem imediatamente.
        Neste momento eu desfaço a conexão, pois mesmo sabendo que esta situação já tinha acontecido há muitos anos, eu estava um tanto perplexa. Alberto olha para mim e diz mentalmente para que eu fique tranquila, vira-se para Maria e pregunta:
        -Maria gostaria de dividir algo conosco?
        -Sabe Dr. tive uma visão muito antiga, lembrei de um ritual que eu costumava fazer para prolongar a vida das pessoas na terra, era algo bárbaro, nem sei como fui lembrar disso.
        -Tudo tem seu tempo Maria, talvés seja o momento de você se livrar desta curpa e se perdoar, e até pedir perdão.
        -É verdade Dr. já se passou tanto tempo, acho que estou pronta pra falar.
        E começamos a falar.....