quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Sentimento de culpa no luto

                   Perder alguém que amamos causa um trauma profundo em nosso psiquismo. O vazio deixado pela perda é muito doloroso e deve ser trabalhado em um espaço terapêutico e por profissionais qualificados. Reviver as emoções que estão guardadas e muitas vezes escondidas em nossa memória fazem parte da aceitação do luto. 
                   Como é possível esquecer um amor que marcou intensamente nossas vidas? Cujas lembranças acendem uma chama que queimam nossas entranhas, nos causando danos emocionais, psíquicos e até físicos. Não dá pra fazer de conta que isso nunca existiu.
                   Nos últimos anos, uma pandemia assolou o mundo, onde milhões de vidas foram ceifadas, fomos obrigados a aceitar a perda como algo corriqueiro, mas não é. A experiência da morte chegou em todos os cantos do planeta e em muitas casas, deixando uma marca profunda de dor e sofrimento em nossos corações.
                    Independente da religião que praticamos e da fé que possuímos, a dor é a mesma, afinal quem amamos partiu e deixou um espaço vazio em nossas vidas. Uma coisa é certa, cada um tem seu tempo e sua forma de encarar o luto, não se pode banalizar a perda de um ente querido.
                     A conduta indicada para enfrentarmos essa dor é a paciência, mas somente quem passa por isso é que sabe o que sente e o quanto sofre a ausência de seu amor. O fato é que ninguém se encontra preparado para perder quem ama, não fomos ensinados a esquecer tão facilmente, muito pelo contrário, gostamos de lembrar dos bons momentos que passamos juntos.
                     Ao mesmo tempo em que é difícil esquecer e aceitar a perda, um outro sentimento muitas vezes nos assola, o sentimento de culpa por sentirmos um alivio ao sabermos que nosso ente querido parou de sofrer. Ver quem amamos sofrendo é uma das maiores dores que as vezes somos obrigados a passar.
                     Vejo com bons olhos a necessidade constante que temos em visitar o túmulo, em guardar roupas e objetos, este é um gesto de carinho e saudades da pessoa que amamos, fazer as tarefas que a pessoa fazia é outra força de reverencia-la. Rezar por ela, lembrar dos bons momentos e agradecer o tempo que passamos juntos é uma das formas de demonstrar a falta e o amor que sentimos, cada um tem seu jeito específico de agradecer e sofrer.
                     Freud no artigo intitulado luto e melancolia, escreve: ''O luto de modo geral é a reação à perda de um ente querido, à perda de alguma abstração que ocupou o lugar de um ente querido, como os pais, a liberdade, o ideal de alguém e assim por diante. Também vale notar que, embora o luto envolva graves afastamentos daquilo que constitui atitude moral para com a vida, jamais ocorre considera-lo como sendo uma condição patológica e submete-lo a tratamento médico. Confiamos que seja superado após um lapso de tempo, e julgamos inútil e até mesmo prejudicial qualquer interferência em relação a ele''.
                     Ao meu entender, nenhuma teoria é capaz de explicar o luto, por ser uma experiência viva, intransferível, única e pessoal. Explicar a dor do luto é como explicar a alegria e o prazer do amor, posso afirmar que o luto tem caráter personalizado e precisa ser vivido passo a passo e não se trata de uma doença que tem prazo para terminar.
                    Cada pessoa tem seu tempo próprio, onde poderão ocorrer ciclos de maior e menor intensidade de sofrimento, pois não podemos deixar de lado as somatizações da vida e do cotidiano, que na maioria das vezes causam baixa imunidade sujeitando a pessoa a várias patologias e até transtornos emocionais.
                    O estado de luto nos obriga a rever valores, buscar outro sentido para a vida com novos ingredientes, como num grande estágio a vida nos obriga a aprendermos a lidar com recomposições psicológicas e emocionais, nos obriga a amadurecermos nossos sentimentos novamente. Vivenciar o luto é uma mudança constante de valores e aprendizados, quase sempre muito dolorosos, mas necessários a nossa sobrevivência.
                    Neste novo capitulo de nossa vida, somos impelidos a buscar respostas a questões que achávamos já estarem respondidas, principalmente no que diz respeito a quem somos e no que acreditamos, sem falar no que pensávamos ser correto em relação ao espiritual. É normal concluímos que existe um mundo ainda maior a ser descoberto, principalmente em termos de religião e espiritualidade.
                     De certa forma o mundo acadêmico desaba no assunto espiritualidade, pois não pode responder de forma satisfatória o que se encontra em abundância nas religiões e nos mais variados formatos de ideologias teológicas. Destacamos a doutrina espírita, no que concerne a continuidade da vida, enquanto somos espíritos imortais em trânsito pelos mundos habitados.
                    Não existe problema algum em sentir saudades, raiva e sentimentos de culpa, somos humanos e nossas emoções podem extrapolar um pouco o bom senso, mas tudo é permitido em termos de dor, afinal a dor é pessoal e somente quem sente é que sabe a falta que seu ente querido faz. Não podemos recriminar o sentir de ninguém, o que devemos fazer é acolher, abraçar e ouvir.

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